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Thursday, March 22, 2007

Nada

Às vezes, o pai do Calvin lê uma história antes da gente dormir. Até que é divertido. Ontem mesmo ele nos contou uma, depois de muita insistência, apelos e gritos histéricos.

....


Em uma pequena cidade de interior, morava um jovem rapaz. Era um rapaz pobre, muito pobre, praticamente redefinia a palavra "paupérrimo" (Pai, o que é paupérrimo? Uma pessoa muito pobre, Calvin). Ele morava em um pequeno casebre, um só cômodo e muito distante da pedreira onde ele trabalhava. Um jovem sacrificado aquele.

Trabalhava duro, dia e noite. 14 horas de trabalho quase ininterrupto, com uma pausa de cinco minutos pro almoço. Era um trabalhador esforçado, nunca queixava-se de sua situação. Dia e noite, noite e dia, lá estava ele quebrando a imensa pedreira pouco a pouco. Ia a pé par casa: demorava quatro horas para chegar em casa, tomava um copo de água e logo voltava ao trabalho.

Certo dia, o jovem encontrou uma imensa rocha de diamante. O maior diamante de todos os diamantes de todos os tempos. E o rapaz ficou rico, muito rico. Comprou fazendas, carros, jóias, mulheres.

Mas também tornou-se cruel. Maltratava os empregados, pisava nas pessoas e usava seu dinheiro pro mal. Tornou-se mal, e seu coração enegreceu.

Mas um dia o sol secou uma de suas várias plantações. Ele, então, vendo o dinheiro que perdera, blasfemou contra o Sol. Quem você pensa que é? Você não pode comigo! Notou que o Sol permanecia indiferente às suas ofensas e logo exclamou-se:

- Eu não sou nada! Poderoso é o Sol! Serei Sol!

E por anos, estudou, pesquisou, conheceu os mistérios da ciência. Por fim, tornou-se Sol. Mas era um Sol mal, queimava plantações, maltratava as pessoas e a terra. Até que um dia uma nuvem parou em frente a seus raios, impedindo-o de causar o mal. Por mais que tentasse, não podia vencer a nuvem. E então percebeu:

- Eu não sou nada! Poderosa é a nuvem! Serei nuvem!

E estudou, desvendou, observou por milhares de anos. Transformou-se em nuvem. No entanto, como nuvem, era mal. Causava enchentes, inundava cidades e maltratava a todos. Porém, certa tarde, quando ia dizimar uma plantação ao sul, um forte vento o levou ao norte. E por mais que lutasse, não podia vencer o vento. Então surpreendeu-se:

- Eu não sou nada! Poderoso é o vento! Serei vento!

E, anos e anos depois, metamorfoseou-se em vento. Entretanto, sendo vento, era mal. Destruía casas, pontes, estátuas, cidades, vidas. Determinada noite, passando por um velho vale, o rapaz-vento notou que uma montanha não cedia a seus caprichos. Então disse a si mesmo:

- Eu não sou nada! Poderosa é a montanha! Serei montanha.

E virou montanha, após milhões de estudos e livros. E, em uma de suas imensas tardes como montanha, ouviu um barulho em sua base. Viu um pedreiro, a moer suas pedras. Furioso, o rapaz-montanha tentou desvencilhar-se, mas nõ se movia. tentou, tentou, mas logo soube:

- Eu não sou nada! Poderoso é o pedreiro! Serei pedreiro!

E, por fim, tornou-se pedreiro. E viu-se de volta ao início, ao que antes fora. Mas antes de perceber seu erro, um tigre sanguinário e traiçoeiro saiu das trevas e atacou-o. E o jovem rapaz, um segundo antes da morte, pensou:

- Eu não sou nada.

....



A moral da história? Bom, não sei. Mas que eu adoro finais em que tigres devoram pessoas, isso eu adoro.

Wednesday, March 14, 2007

Divagações de verão

À sombra de um cajueiro, em um parque perto de casa. Tardezinha de verão, o sol escondendo-se entre as nuvens. Calvin e eu deitados sob a árvore, olhos fechados e brisa no rosto. Quem passasse por ali diria que estávamos dormindo. E eu tava mesmo.

- Hobbes?

- Hmmm...

- Hobbes, você tá acordado?

- Não, Calvin, não estou.

- Certo.

Algumas folhas voam ao nosso redor, rodopiando no ar rapidamente. Cinco minutos passam. Eu dormindo, Calvin pensando.

- Hobbes?

- Hmmm...

- Eu tava aqui pensando...Será que eu sou mau?

- Como assim, Calvin?

- Ah, eu acho que não sou boa pessoa, sabe. Todo dia dou trabalho pra mamãe. Papai não tem uma noite de sono decente faz dias por minha causa. Além disso, a tevê tá sempre falando sobre esse monte de problemas mbientais que poderiam ser evitados se cada um fizesse sua parte. Será que eu faço minha parte? Outro dia mesmo a moça do jornal disse que um monte de animais sofrem com testes dos produtos que a gente consome no dia-a-dia. Será que eu não podia evitar o sofrimento desses animais? Será que eu tô sendo mau por não fazer alguma coisa? Se eu tentasse fazer mais, eu não seria uma pessoa melhor, uma pessoa boa? Será que eu sou mau?

- ...

- Hobbes?

- Hum? Que foi, Calvin? Eu não escutei.

- Ah, deixa pra lá.

Friday, March 09, 2007

Televisão, um milhão e pipoca

Calvin e eu costumamos refletir bastante sobre o mundo. Sempre pensamos, avaliamos, analisamos e chegamos a conclusões maravilhosas sobre a Vida, o Universo e Tudo Mais. Geralmente também acabamos comemorando nossas descobertas fantásticas com um delicioso sanduíche de atum, mas isso não vem ao caso.

Outro dia mesmo divagamos sobre esses assuntos miúdos da vida. Enquanto esperávamos um daqueles filmes de violência desregrada e dinossauros mutantes de duas cabeças, zapeávamos pelos canais intensamente. Foi então que um grupo de pessoas alcoolizadas e semi-nuas dominaram a tela, discutindo qualquer coisa com muita raiva.

Logo imaginamos que era um daqueles programas que o Calvin é proibido de assistir e então logo continuamos assistindo. Mas não demorou muito pra notar que era só um daqueles programinhas de terceira sem nenhum mutante ou pancadaria real.

- Hobbes, eu não entendo esse programa. Não tem graça alguma e mamãe disse que tem uma audiência danada.

- Ah, Calvin, eu também não sei bem. Talvez as pessoas gostem de ver como as relações pessoais ficam diante do convívio intenso e da competição acirrada. Tipo um labirinto de ratos humano, sabe?

- Qual o sentido em dar um milhão para uma pessoa ficar sem fazer nada por três meses? Eu fico ocioso durante as férias inteiras e não recebo um centavo pra isso! Mamãe até reclama!

- Eu acho que eles estão meio que se vendendo, Calvin. Dando a sua intimidade e dignidade em troca de fama e, talvez, um milhão. É quase um contrato: me faça famoso que eu abro mão de todos meus direitos.

- Mas mamãe se mete na minha intimidade toda hora e o máximo que ganho é aquela comida melequenta e roupas.

- Bom, o mundo é um lugar estranho mesmo.

- E injusto, Hobbes. Não acredito que esses...Opa! Começou nosso filme.

- Passa a pipoca aí.

Thursday, March 08, 2007

Pingos nos is

Hobbes tem se portado muito mal ultimamente, e talvez por isso tenhamos passado tanto tempo longe deste blog. “Conversas de bastidores”, como devem chamar os caras famosos, mas eu prefiro chamar de “discussão acalorada sobre que diabos está acontecendo aqui”.

Acontece que começamos esse projeto simples de dominação mundial muito alegremente e até conseguimos continuar assim por algumas semanas. Ocorre, no entanto, que um trabalho em equipe é sempre mais difícil, simplesmente por ser em equipe. Mais difícil ainda quando a sua equipe é um tigrezinho rebelde que fica questionando sobre tudo o tempo todo.

Começou com esse papo de ele me chamar de ditador, como vocês podem ver aqui. Acertamos tudo. Num outro dia ele apareceu todo ranziza dizendo aqui que não tinha aprovado nossa brincadeira de trocar cabeças. Como se ele também não tivesse se divertido pra valer com o lance da troca. Dá pra ver o quanto ele tá feliz na foto, ó:

Mas não, ele talvez pense que isso aqui é um daqueles blogs de menina estilo diarinho, pra vir contar tristezinhas e esperar a solidariedade das pessoas. Se a Susie tivesse um blog ele seria assim. Mas jamais poderei permitir que nós do clube Abaixo as Meninas Sebosas façamos uma coisa dessas. Agora já conversamos e acredito que nos acertamos de novo.

Mas vou deixar de papo-furado. Isso tudo foi só pra dizer que não ligamos se hoje é dia da mulher ou sei lá o quê. Não daremos parabéns pra Susie nem nada parecido, porque somos do mal.


- Entendido?