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Thursday, December 28, 2006

Rár

Nosso passeio pelo bosque acabou se estendendo além do planejado. Foi quando Hobbes e eu dedicidimos que era hora de exercitar nosso lado escoteiro para o caso de precisarmos algum dia. Fixamos residência em uma grande árvore e passamos lá uma noite agradável. Mas como nossos suprimentos se esgotaram rapidamente e o suposto tigre selvagem não foi capaz de arranjar-nos um alce suculento, voltamos pra casa logo de manhã.

Quando chegamos avistei na frente de casa uma viatura policial e ao entrar em casa mamãe veio correndo e gritando como louca. Apertou-me, também como louca. E disse, como louca, que estava muito preocupada. E isso só porque eu havia passado a noite fora. Incrível como os adultos podem ser carentes às vezes.

Depois passaram um sermão dizendo que eu não devia bancar o escoteiro sem os devidos preparos e sem um adulto por perto. Incrível como também podem ser tapados. Mas as coisas logo se ajeitaram com a chegada da neve anunciando que o Natal estava próximo.

Eu e Hobbes aproveitamos pra confeccionar nossos bonecos de neve. Mas ao vê-los, mamãe e papai disseram-me que eu estava desenvolvendo um espírito muito rebelde, passando noites fora de casa e moldando minha subversão em inocentes bonecos de neve. Por isso, disseram que eu deveria ir ver um tal psicólogo.

Quando vi o psicólogo, notei que na verdade se tratava do Barba-Ruiva (embora ele negasse sua identidade), e por isso comecei a gostar muito dos nossos encontros. Imaginem, um pirata de verdade! E ele não era como os outros adultos que nunca tem tempo pra nada: o Barba-Ruiva sempre me dava ouvidos. Comecei a contar-lhe dos nossos feitos fantásticos e nossas aventuras incríveis (e, claro, dos nossos bonecos) e ele, sempre muito atento, tomava nota de tudo em um caderninho.

Seu problema era que sempre no clímax das histórias (tenho que mencionar aqui as interpretações de Hobbes que muito me auxiliaram nas narrativas) ele dizia "sua hora acabou" e saía. Devia ser um pirata ocupado com muitos navios a pilhar. Apesar disso, eu estava aprendendo muito com o Barba-Ruiva, alguns nós muito interessantes na cauda do Hobbes.

Mas houve um dia em que eu estava indo ver o Barba-Ruiva e ouvi mamãe e papai conversando no carro:

- As sessões não estão adiantando muito.
- Não estão - falou papai.
- O psicólogo disse que não está evoluindo.
- É um caso perdido.
- Agora ele acha que é um pirata.

Naquele dia após meu encontro com o Barba-Ruiva soube que seria a última vez que o veria. Mamãe e papai disseram qualquer coisa como "as coisas não estão andando", mas eu sabia que ele havia zarpado para alguma viagem perigosa atrás de tesouros antigos.

Agora, estou me preparando pro dia em que ele vai voltar e nos pegar. Hobbes já está aprendendo a falar como um papagaio, acho que assim Barba-Ruiva poderá aceitá-lo a bordo. Mas enquanto o destemido pirata não volta, vamos limpar o convés e continuar a toda vela com o Calvinbol. Rár.

Sunday, December 10, 2006

Fomos dar um passeio



Estaremos de volta assim que chegarmos.

Wednesday, December 06, 2006

Pi

Hobbes comentou uns posts atrás sobre esse negócio de coincidência. As coisas que acontecem quando a gente pensa nelas, os sanduíches que a mamãe prepara quando a fome aparece. Mas tem umas coisas muito mais engraçadas acontecendo por aí. Esses dias mesmo eu tinha lido uma notícia na Internet de um garoto chinês que recitou de cor 67.890 casas decimais do número Pi.

O fato é que no dia seguinte a eu ter lido essa notícia a professora veio com uma prova surpresa. E na prova surpresa tinha uma outra surpresa: a notícia do garoto chinês que recitou 67.890 casas decimais do número Pi. O outro fato é que eu não ganhei nenhuma vantagem por ter lido a notícia antes, visto que a professora pedia pra analisá-la sob a perspectiva de critérios jornalísticos baseados em alguns teóricos gringos que eu nunca ouvi falar.

Mas isso não vem ao caso. Na verdade, nem esse negócio de coincidência vem ao caso. Fala sério, ninguém aí ficou chocado com a notícia do china? O moleque conseguiu lembrar de 67.890 totalmente aleatórios! Caraca, minha gente, isso é sobre-humano.

O garoto, se assim podemos chamá-lo, estudava 10 horas por dia. 10 horas por dia decorando números. Eu me pergunto: será que esse cara não tinha mais nada pra fazer? Ok, esses orientais são mesmo obstinados, se concentram em um objetivo. Mas por tudo que é mais sagrado, será que ele não fazia mais nada na vida?

Pleisteichon é óbvio que ele nunca ouviu falar, futebol menos. Mas será que ele não tirava nem alguns segundos pra incomodar sua mãe ou pra sair gritando pela rua ou pra xingar alguma Susie? Se eu tivesse 10 horas por dia pra perder desse jeito, eu aposto que faria coisas muito mais interessantes.

Caraca, pensando direito, eu tenho 10 horas livres por dia...

- Hobbes, tá a fim de decorar o Pi?

Monday, December 04, 2006

Totalitarismo

Eu e Calvin discordamos sobre inúmeros assuntos, sabe. Geralmente, as opiniões do Calvin são totalmente contrárias às minhas. Acho que nossa única coisa em comum é o gosto pela televisão. Assim, a gente briga muito. O rapaz é genioso, mas eu sou mais forte. Mas, agora com esse blog, nossas opiniões se expressam mais e nós nos socamos mais também.

Primeiro foi o nome do blog. Devidamente persuadido convencido, deixei passar. Depois, nosso profile no orkut. Pra variar, o garoto colocou seu nome na frente do meu. Depois de ficar duas horas trancado no armário, concordei com isso também. Agora o pequeno Mussolini decidiu que devemos apagar nossos scraps pra "manter a privacidade de nossa vida social". Como se ele tivesse vida social.

Gente, minha memória é fraca. Quando eu deixo um scrap, estou salvando em um servidor do Google justamente pra poder vê-lo mais tarde. Mas alguém aqui se importa com a opinião do Hobbes? Claro que não. Apaguemos os scraps, mesmo sem o consentimento do tonto aqui ou sem que ele leia.

Eu quero liberdade de expressão e escolha. Mas aqui é sempre Cavin primeiro e Hobbes depois. Escrevam o que estou dizendo. Qualquer dias desses, o ditadorzinho de meia-tigela vai começar a censurar meus posts e minhas listras, dizendo que são subversivos.

Thursday, November 30, 2006

Stay beautiful

Com o substancial aumento da nossa popularidade, Hobbes e eu decidimos criar um e-mail para dar vazão às centenas de cartas de fãs que, pelas nossas estimativas, começarão a chegar em breve. O endereço está ali ao lado.

Entrando na onda, decidimos também investir nesse tal orkut de que todo mundo fala. Queríamos criar uma comunidade através da qual pudéssemos arrebanhar nossos seguidores. Descobrimos que primeiro teríamos que criar um perfil através de um cadastro besta que pergunta até a cor do cavalo branco de Napoleão. Claro que não respondemos nada, porque somos do mal.

Enfim, a comunidade do Calvinbol já está lá, cheirosa e limpinha. A propósito, vocês não querem entrar e tomar uma xícara de café?

Tuesday, November 28, 2006

Assistindo Earl

- Hobbes, eu não entendo esse cara. Sempre que uma coisa boa acontece a ele, é o “karma”. Nunca é uma coincidência cósmica ou merecimento próprio, sempre o “karma”. Sempre que uma coisa ruim acontece, é o “karma” outra vez. Só que testando ele. Choveu de manhã? “Karma”! Ganhou na loteria? “Karma”! Teve sua mão devorada por um jacaré mutante dos esgostos? Olha o “karma” aí , gente! Sabe, isso é degradante. Será que sua dignidade não é ferida por ser escravo do “karma”? Não entendo isso.

- É a fé, Calvin. Ele acredita na sua listinha e sua fé vai contra qualquer lógica.

- Mas veja só. Se algo bom acontece, não é graças ao “karma”. É simplesmente o seu esforço próprio voltando pra ele. Por que diabos ele dá todo o mérito a uma coisa nem mesmo palpável que, se é que existe, pouco influencia sua vida? Essa fé é tão cega? Essa fé o move a frente mesmo contra a lógica?

- Basicamente, Calvin. Outro dia um cara numa propaganda na tevê disse uma frase: “Há mais coisas entre o Céu e a Terra do que sonha nossa vã filosofia”. Acho que essa frase mostra como Earl acredita que o mundo possui forças maiores que nós e que elas atuam em nosso mundo.

- Claro que há coisas entre o céu e a Terra. Pássaros, ionosfera, satélites naturais e artificiais, cometas.

- Acho que não era bem isso que...

- E aquela história de liberdade? Não há livre-arbítrio? “Seja bonzinho, ou o karma vem te castigar”. Hobbes, isso é uma ditadura! Não temos escolhas! Não podemos fazer o que queremos, mas sim o que o karma (ou Deus ou seilá) quer. Eu não posso xingar aquela menina sebosa da escola senão o karma vem me castigar, é isso?

- Mas, Calvin, se o tal do "karma" existisse mesmo o mundo não seria muito melhor? Digo, as pessoas não seriam mais legais umas com as outras?

- Não, o mundo seria mais legal se tivéssemos mais biscoitos recheados. E, já que estou sonhando, um mundo sem dever de casa seria muito mais legal também.

Sunday, November 26, 2006

Ave, Earl

É engraçado como coincidências acontecem. Uma pessoa te ligar quando você pensou nela, o Calvin aparecer com um sanduíche de atum quando acabo de pensar nele, alguém comentar uma coisa que você acabou de escrever no blog sem nem conhecer seu blog. Pode ser a mente procurando por padrões dentro do universo. Em todo caso, coincidências acontecem muito.

No mesmo dia que Calvin postou aquele texto sobre a crença e a mentira, nós assistimos algo relacionado com o assunto. Bom, pelo menos eu acho que é relacionado com o assunto. Uma série muito da supimpa. My Name is Earl.

Temos assistido várias séries, sabe. Depois que o pai do Calvin cancelou a tevê a cabo pra conter despesas, o garoto passou a baixar tudo pela rede ilegalmente, lógico. A cada dia, ele coloca uns dois torrents pra baixar. Antes que pergunte, ele usou a velha história do "pô, preciso da internet pra pesquisas escolares, pai" para evitar o cancelamento da banda larga. O pai dele, relutante, deixou passar. Sorte a nossa.

E assim conhecemos My Name is Earl. A história é simples. Com o objetivo de mudar sua vida, Earl Hickey decide fazer uma lista contendo todas as coisas ruins que já fez em sua vida até aquele ponto e "repará-las", uma por uma. Assim, Earl acredita que seu karma será também reparado e coisas ruins irão parar de acontecer a ele.

Vejam só como a história demonstra tudo o que Calvin disse. Mesmo sem uma prova mínima ou aceitável, o bigodudo Earl tem toda fé em sua lista. E se mete nas mais incríveis (e divertidas, diga-se de passagem) confusões só para manter seu objetivo. Mesmo ele sendo baseado em uma crença tão simplista e improvável.

O que quero dizer é: as pessoas acreditam pois precisam de um ponto de apoio na vida. Uma lista, um cocada, uma melancia, um amigo imaginário. Mesmo que tenham que mentir para si mesmos, elas acreditam com toda sua força. Afinal, a vida é tão chata e sem sentido sem algumas mentirinhas necessárias, não é mesmo minha gente?

Tuesday, November 21, 2006

Ave, Pedra

Papai escutava o rádio outro dia, um novo hábito que ele está adquirindo com os anos. Pessoalmente, não consigo entender como alguém possa preferir o rádio a televisão, com aqueles comerciais tão mais bonitos e atraentes. Ele disse que era uma rádio cristã. Pessoalmente, também não entendo como alguém possa preferir uma rádio cristã a uma de rock’n’roll. Mas não importa, papai anda mesmo estranho ultimamente.

Enquanto conversava com ele, escutei no rádio um homem de voz semi-polida falar dessa crônica. Enquanto mandava Hobbes se aquietar, dei um pouco de atenção ao rádio, e percebi que não se tratava de crônica, mas de uma historinha com uma moral bonitinha, dessas que circulam a Internet sob forma de correntes. Mas não surpreende que os cristãos não saibam o que é uma crônica.

A história dava conta de um caminhoneiro, me parece. Mas poderia ser também um cozinheiro, porque não atentei bem aos detalhes, obviamente. Devia ser mesmo um entregador de pizza. E ele passava todos os dias por uma longa estrada. Até que certa vez, ao olhar para cima, avistou uma figura que se parecia com uma imagem de Sua Senhora, e não “Nossa”, como disse o homem do rádio.

A partir daquele dia, todas as vezes que passava por aquele ponto da estrada de onde era visível a imagem, ele clamava por suas bênçãos e seguia feliz para entregar suas pizzas. E teve um dia em que ele estava necessitado e pediu por uma coisa muito, mas muito grande. Não lembro o que era, mas devia ser uma pick-up daquelas tipo monstro. Foi atendido. Então ele ficou muito feliz e fez uma promessa de que iria visitar a imagem no dia seguinte. Para agradecer de perto, sabe? E ele foi, subiu o morro onde ficava a imagem, e quando chegou lá, uma surpresa: viu que a Sua Senhora era na verdade uma pedra. E devia ser mesmo uma pedra bem bonita e grande.

Essa foi a história, que estranhamente terminou por aí. A história de um homem que teve a vida modificada por ter fé em uma pedra; por ter lançado suas esperanças no ser bruto e simples que é uma pedra. Apesar de ser uma bem bonita e grande.

Fiquei pensando. Não que eu culpe os cristãos por seu culto a pedras, digo, imagens. Eles são cristãos, fazem o que querem. Me surpreende é a ironia de ter ouvido uma história como essa numa rádio... hmm, cristã. No entanto, eu compreendo que “ironia” seja uma figura de linguagem que deve passar despercebida aos conhecimentos cristãos.

Pois para mim a moral da história diz que fé é uma coisa interna, não externa. Que a mentira depende somente de nós mesmos, que tanto faz ter fé num deus ou em uma melancia, importa é a sensação que essa fé proporciona aos homens de boa vontade na Terra do Senhor.

Ela mostra de modo claro e mágico que a fé nos Céus é mais uma falácia, pura e simplesmente. É o acreditar em algo maior simplesmente para ter em que se agarrar. E no fundo, no fundo, até um cristão é capaz de ver a beleza numa história como essa, porque ele até compreende o sentido da coisa, embora não possa ir além disso.

Todos amam as Mentiras, pois todos são dependentes delas. A ficção torna as coisas mais simples: facilita a vida, facilita a vivência. Tudo fica mais fácil com histórias. Por outro lado, elas exaltam a ignorância, uma outra benção de que somos todos dependentes.

Afinal, de que outra forma, senão por uma história, se veria um cristão criticando a própria essência de sua crença de forma tão natural e bela?

O Homem do Tempo

Depois do fracasso que foi Sahara, o Calvin falou pra mãe dele que ela precisava se redimir. O garoto ficou uma semana insistindo que a mãe infligiu-lhe um dano cerebral grave por alugar Sahara. A mulher ficou transtornada com a idéia de ter "afetado a mente do próprio filho de modo quase irreversível que o impediria de ter um emprego que não fosse faxineiro de algum bar de segunda categoria", nas palavras do próprio Calvin.

Saiu desvairada na hora do almoço e voltou duas horas depois com um filme debaixo do braço. Um sorriso no rosto: "Vamos reverter esse dano cerebral logo pra que você seja o único causador de seu próprio fracasso, Calvin".

E assim assistimos a The Weather Man, magicamente "traduzido" como "O Sol de Cada Manhã", por alguma razão que a própria razão desconhece. Sabe aquele tipo de filme que te deixa alegre, dá uma forte motivação e vontade de cantar uma bela canção? Pois bem, este não é nada parecido com isso.

Thursday, November 16, 2006

O Professor Novo

Mamãe chegou outro dia com uns filmes, disse que seria bom fazermos algum programa em família. Eu e Hobbes concordamos que passar algum tempo com ela seria bom. O problema é que mamãe não sabe escolher filmes. Ela deve ter pensado que me agradaria a sua escolha do bobo Sahara. Acontece que o filme é tão tolo que até pra mim é tolo.

Vamos lá, não é muito difícil agradar aos garotos. Tudo que se espera é um pouco de lutas, com muita violência e algumas pessoas se dando mal, para que possamos nos divertir sem culpa com a tragédia dos outros. Tá, Sahara até tem isso, mas é um grande e bobo amontoado de clichês indigerível até para um tigre selvagem.

Fiquei até imaginando como deve ter sido escrito o roteiro de um filme assim, sabe. Um filme tão tolo.

***

Uma vez, na Escola dos Grandes Diretores, chegou um professor novo. Era daquele tipo que não segue as regras do bom professorado e deixa todo mundo perplexo pela falta de ortodoxia. Ainda mais sendo na Escola dos Grandes Diretores, onde ser ortodoxo era o mesmo que ser correto. Ou, pelo menos, foi isso que todos sempre pensaram.

Mas, por algum motivo, o Conselho que Contrata Professores Novos achou que era hora de inovar e dar uma faceta mais jovem à Escola. Ela estava em evidente decadência, e é nessas horas que uma mudança de postura é necessária. Vai ver foi por isso que chamaram de muito longe aquele professor, que chegou trazendo na mala apenas duas camisas e duas calças. O resto ele compraria por ali mesmo que era para iniciar uma nova vida.

Material didático mesmo ele não tinha. Nem cadernos nem livros. Gostava de repetir que tudo que possui “está aqui ó” – e ao dizer isso ele dava duas cutucadinhas na cabeça com o dedo indicador. Gostava de dizer umas tantas outras coisas, como a vantagem de se usar meias coloridas em dias de sol, mas era a sua competência com as palavras que mais chamava a atenção. Por isso todos diziam que ele era de algum país latino. Não que isso tivesse qualquer fundamento.

Depois de comprar umas camisas novas, uma das quais tinha um I, um coração sinuoso, um N e um Y, ele foi dar a sua primeira aula, mas usando obviamente a camisa cinza de linho, que deveria dar a ele um ar de seriedade, desabotoada na última casa, porque, sempre um pouco atrasado, era sintomático que ele deixasse de abotoar todas elas. Material para a aula ele só trazia algumas folhas foto-copiadas de um roteiro que ele mesmo havia escrito na noite anterior.

- Vocês têm em mãos o Roteiro a Ser Evitado.

Como resposta ao silêncio da turma, disse:

- Tudo que vocês devem fazer é evitá-lo. Leiam.

E ao dizer isso, o professor deu as costas à classe e saiu pela porta, deixando um silêncio excruciante atrás de si. Os alunos estranharam todos o novo e revolucionário método de aula, que não tinha slides, livros respeitavelmente grandes, e muita falação, mas iniciada a leitura do Roteiro a Ser Evitado ficaram de tal forma imersos que nem se chatearam pelas duas horas em que o professor deveria dar sua aula, e em vez disso, abandonara-os após dizer poucas palavras.

O professor, com sua camisa cinza de linho, após sua grande primeira aula andou triunfante pelo longo corredor da Escola dos Grandes Diretores. Desenhou ao canto da boca um pequeno sorriso de contentação e pensou consigo que “estava feito”.

Por todo o semestre, o professor reproduziu o mesmo modelo básico de aulas. Dificilmente o mestre ficava mais que 10 minutos com a turma. Isso, claro, fez com que ele não fosse dos professores mais cultuados pelos alunos, com os quais não tinha muito tempo para criar laços.

Resultado dessa distância foi que toda uma mitologia se criou ao redor da figura quase esquálida do professor, que após o primeiro mês de aula decidiu que devia mesmo abandonar sua camisa de linho cinza e ostentar seu modelito I Love New York não só em casa.

- Dizem que ele é um hacker que se finge de professor.
- Um hacker, sim. Parece que veio pra cá depois que causou um rombo na Receita Federal.
- Mas o que isso tem a ver?
- Não me pergunte.

- Não passa de um turista.

- Dizem que leu a Bíblia em um dia.
- A Bíblia em um dia?
- E Os Lusíadas em 15 horas.

Mas de uma coisa nenhum desinformado dava cabo: apesar de seus métodos estranhos, aquele realmente era um grande professor. E sozinho foi mudando aos poucos o jeito de se dar aula na Escola dos Grandes Diretores. Por influência sua, dali começaram a sair os maiores diretores de Hollywood. Steven Spielberg era um deles. E ele, como todos sabem, fez ET, O Extraterrestre. O mundo havia derramado lágrimas diante de um ET bonzinho e so human, enquanto o resto dos diretores do mundo se preocupava em pintá-los como tiranos sanguinários. E isso era só uma amostra do que causou o professor novo.

Agora ele já não era mistificado pelos alunos, tampouco pelos outros professores. Depois de ET, feito por um aluno seu, as coisas haviam mudado. Os métodos pouco conservadores do professor haviam se configurado no verdadeiro regime didático dentro da Escola dos Grandes Professores. Os professores todos vestiam agora camisas de I Love New York. E ninguém mais se preocupava se o professor era latino, asiático ou algum serial killer. A sua origem, aliás, nunca foi esclarecida, e por isso alguns grupos alternativos juravam que ele era um alienígena achado na Área 51.

Todavia, o maior passo do professor dentro daquela escola haveria de se configurar no fato que o lançaria para sempre na sarjeta da culpa, e logo do esquecimento. Tudo porque em sua primeira classe o professor novo tinha um aluno que se chamava Thomas Dean Donnelly. Todos o chamavam de Dindon – um trocadilho com o seu sobrenome Dean Donn, e uma brincadeira com o fato de que Thomas não se dava bem com o despertador. Em verdade, era um garoto prolixo que vivia dormindo. Em casa, na aula, na lanchonete com os amigos, sempre dormindo. Estava dormindo o Dindon no dia da sua primeira aula com o professor novo.

Por conta disso, ele não havia escutado aquelas frases que até hoje ecoavam orgulhosamente na mente da primeira turma que teve o privilégio das aulas do professor novo. Eles podiam recitar cantarolando. “Vocês têm em mãos o Roteiro a Ser Evitado”. Dançando até. “Tudo que vocês devem fazer é evitá-lo”. E divertiam-se: “Leiam”!

Dindon dormia e por isso Dindon não leu. E ele era daqueles alunos que só se formam porque Deus definitivamente é um cara bonzinho. Depois de formado, Dindon só sabia que deveria fazer um filme. Um filme qualquer, e isso era tudo. Depois de muito pensar, o que não demorou muito, Dindon foi até o seu armário atrás de algumas idéias, e achou algumas folhas, as folhas foto-copiadas do Roteiro a Ser Evitado. Ele leu aquele texto e ficou maravilhado, bobo até. Obviamente havia uma boa razão para ser evitado, como por exemplo o fato de ser o supra sumo dos clichês, mas Dindon era muito desatento para perceber isso.

Ele estava convicto, seria aquele seu primeiro filme. Então, Dindon mudou o nome para algo mais bonito. Se chamaria Sahara e teria uns rostinhos bonitos como o de Penélope Cruz. Foi assim. Tudo simples. E Thomas Dean Donelly finalmente tinha em mãos o seu primeiro longa metragem.

Quando reconheceu o seu Roteiro a Ser Evitado, e ainda sendo lançado com estardalhaço, o professor novo se ressentiu de uma culpa inexplicável. Aquilo nunca poderia acontecer, jamais o Cinema poderia ter algo tão pífio como aquele filme, porque afinal ele deveria ser evitado para sempre. Não poderia, jamais. Mas aconteceu. E foi o bastante para que o professor abandonasse sua carreira brilhante. Foi o suficiente para que alguns anos depois ele virasse só mais uma lenda dentro da Escola dos Grandes Diretores.

O Roteiro a Ser Evitado não havia sido evitado. Era o fim.

***

Ou pelo menos foi isso que imaginei quando vi esse filme tão tolo.

Oras Bolas

O Hobbes estava meio intrigado com o nome escolhido pro blog. Problema dele não estar por perto quando resolvi criar a bagaça. Certamente que Calvinbol tem uma boa razão de ser, e o primeiro-tigre Hobbes já foi devidamente persuadido informado. Entretanto, por ora só sabem dessa informação ultra-secreta os membros do clube AMS – Abaixo as Meninas Sebosas. Talvez um dia resolvamos trazê-la a público. Rezem, mortais.

Tuesday, November 14, 2006

Que tal Vinbbes?

Andei conversando com o Calvin sobre o nome do blog. Ele estava tentando destruir consertar uma torneira no banheiro. Nem preciso dizer que a coisa não deu muito certo.

- Calvin, preciso conversar com você.
- Hobbes, eu vou consertar essa torneira agora. Mas você pode falar que eu finjo que escuto.
- Você tem certeza do que está fazendo?
- Claro. É só desmontar uma coisa ali e aqui e pronto. Sou um encanador nato.
- Então tá. Voltando ao assunto, tô com um problema com o nome do nosso blog.
- Hmm.
- Por que tem que ser Calvinbol? Não que eu queira Hobbesbol, mas o blog é de nós dois. O nome podia citar ambos ou não citar ninguém.
- Hmm.
- Algo como Calvinhobbesbol, que tal? Ou Hobbescalvinbol?
- Hmm.
- Calho? Hobvin?
- Hmm.
- Calvin, a água não devia parar de vazar?
- Chame os bombeiros! Os bombeiros! Oh meu Deus, eu vou me afogar! Fujam para as montanhas! PARA AS MONTANHAS!

Droga, acho que agora só vou poder falar com o Calvin depois que o teto da cozinha parar de pingar.

Saturday, November 11, 2006

Oi.

Meu nome é Hobbes. Mas podem me chamar de Haroldo, se assim lhes parecer conveniente. Prazer em conhecer vocês. Vocês vêm sempre aqui?

Eu cheguei acelerado e vendo tudo diferente no Calvinbol querendo fazer um pequeno protesto. Como vocês viram no primeiro post, essa é uma iniciativa minha e do Calvin pra dominar o mundo levar textos supimpas e opiniões pro mundo bloguístico (ou blogueiro, sei lá). Mas o Calvin, com sua mente extremamente egoísta, nomeou o blog de Calvinbol, uma nítida referência ao nome do rapaz.

Devo dizer pra vocês que sou um presente pra vida desse jovem amargurado e hiper-ativo. Sou mesmo. Sem mim, não sei o que seria do rapaz. Cá entre nós, sou praticamente o único amigo dele. Afinal, não vamos contar aquela menina da escola com quem ele mal se entende. Os verões dele seriam muito tediosos sem mim. Digo, seriam mais tediosos.

Calvin é ranzinza demais, sabe. Sempre reclamando, inventando histórias e criticando tudo. Às vezes, preciso dar umas pequenas tiradas nele só para que ele perceba o quanto é tolo. Ainda lembro do dia em que nos conhecemos.

- Oi.
- Oi.
- Aparentemente, eles querem que sejamos amigos.
- E seremos amigos?
- Pelo visto, não tenho muita opção.
- Ahnnn, sei. Mas agora me diga. Esse sanduíche aí é de quê?

Sempre assim o Calvin. Mas agora ele passou dos limites. Na primeira oportunidade, ele coloca o seu nome em nossa iniciativa! Me sinto traído. Fala sério, né? Por que tinha que ser Calvinbol e não Hobbesbol? Ou Haroldobol?

Se bem que é melhor ficar com Calvinbol por enquanto. Hobbesbol não me parece um nome muito bom pra um instrumento de conquista universal blog (eu gostei muito desse negócio de riscar o texto, sabe).

Tuesday, November 07, 2006

Apresento-me

Meu nome é Calvin e minha vida foi uma série fascinante de feitos fantásticos, a respeito dos quais eu tenho muitas revelações profundas.

Mas francamente, nada disso é da conta de vocês, então caiam fora! FIM.

Friday, November 03, 2006

O Império Contra-ataca

Calvin diz:
Hobbes, estive pensando em tentar dominar o mundo. Por onde você acha que devíamos começar?

Hobbes diz:
Manipulação de massas, Cérebro Calvin, sempre é a solução. Veja o youtube.

Calvin diz:
Acho que deveríamos começar nosso próprio Império na Internet. Andam dizendo que os blogs são a nova forma de expressão do povo. Você sabe que conquistar um povo já unificado é sempre mais fácil. Acho que foi Napoleão que disse isso.

Hobbes diz:
Um blog é um bom início. Torne-se íntimo e conquiste-os antes de dominá-los. Acho que os gregos disseram isso e se não disseram, deveriam ter dito. Mas por onde começamos?

Calvin diz:
Devíamos começar tendo uma boa conversa sobre dominar o mundo. Mas espere, acho que é isso que estamos fazendo.

Hobbes diz:
A sua perspicácia me surpreende às vezes, sabe.

Calvin diz:
Mamãe também diz isso. Mas vamos ao trabalho. Devemos então criar um blog, depois conquistar o povo através de sistemas eficientes na Internet, até conseguirmos passar ao mundo real e invadir a privacidade das pessoas para convencê-las a tomar litros de Calvin-Cola...

Hobbes diz:
Melhor ficarmos só com o blog por enquanto...